Recebimento: 01/09/2022 11:52:53 |
Fase: Emitir Parecer da Procuradoria sobre Projeto de Lei |
Setor:Procuradoria |
Envio: 04/10/2022 09:13:57 |
Ação: Parecer da Procuradoria Emitido
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Tempo gasto: 32 dias, 21 horas, 21 minutos
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Complemento da Ação: PARECER DA PROCURADORIA
PROJETO DE LEI Nº 5125/2022
“DISPÕE SOBRE O LIVRE ACESSO DOS VEREADORES AOS ÓRGÃOS E REPARTIÇÕES PÚBLICAS”.
Projeto de Lei de iniciativa do Poder Legislativo Municipal, de autoria do vereador ALYSSON F. G. REIS, visando dispor sobre o livre acesso dos vereadores aos órgãos e repartições públicas municipais.
A competência privativa do Poder Executivo Municipal está inserida nos artigos 31, inciso IV e 58, inciso XIII e seguintes da Lei Orgânica Municipal. (verbis)
Art. 31 – A iniciativa das Leis cabe à Mesa, a Vereador ou Comissão da Câmara, ao Prefeito Municipal e aos cidadãos na forma e nos casos previstos nesta Lei Orgânica.
(...)
IV – criação, estruturação e atribuições das Secretarias Municipais e órgãos da administração pública municipal;
(...)
Art. 58 – Compete ao Prefeito Municipal, entre outras atribuições:
(...)
XIII - dispor sobre a organização e funcionamento da administração municipal;
Preliminarmente, devemos ressaltar que há vício de iniciativa, pois o projeto de iniciativa do legislativo municipal invade a competência do Chefe do Executivo.
No tocante ao alegado vício de iniciativa, verifica-se que o projeto de lei é inconstitucional por vício de origem, pois é de iniciativa privativa do Prefeito o projeto de lei que versa sobre a direção e a organização da Administração Pública Municipal, conforme artigo 31, inciso IV c/c artigo 58, inciso XIII da Lei Orgânica do município de Linhares.
Assim, à luz do princípio da simetria, constata-se que o Projeto de Lei N° 5125/2022 padece de inconstitucionalidade formal, eis que afronta a Constituição Estadual em seu artigo 63, parágrafo único, inciso III, que dispõe ser de competência privativa do Chefe do Poder Executivo as leis que disponham sobre organização administrativa do Poder Executivo, por afronta ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes, bem como material, haja vista que impõe obrigações e gastos financeiros pelo Poder Legislativo ao Executivo, afrontando o Princípio da Separação dos Poderes.
Trata, assim, de matéria que deveria ser objeto de projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal, a teor do art. 63, § único, III, VI, da Constituição do Estado do Espírito Santo.
Destarte, a eventual ofensa a este princípio pelo Poder Legislativo inquina o ato normativo de nulidade, por vício de inconstitucionalidade formal, em razão da indevida ingerência na esfera de competência exclusiva do Poder Executivo.
Neste sentido, importante ressaltar que nosso excelso Supremo Tribunal Federal vem sedimentando tal entendimento sobre leis que tratam sobre esse mesmo tema. Segue importante julgado que sintetiza bem esse entendimento:
“(...) 2. A fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é um dos contrapesos da Constituição Federal à separação e independência dos Poderes: cuida-se, porém, de interferência que só a Constituição da República pode legitimar. 3. Do relevo primacial dos ‘pesos e contrapesos’ no paradigma de divisão dos poderes, segue-se que à norma infraconstitucional – aí incluída, em relação à federal, a constituição dos Estados-membros -, não é dado criar novas interferências de um Poder na órbita de outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Lei Fundamental da República. 4. O poder de fiscalização legislativa da ação administrativa do Poder Executivo é outorgado aos órgãos coletivos de cada câmara do Congresso Nacional, no plano federal, e da Assembleia Legislativa, no dos Estados; nunca, aos seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação (ou presentação) de sua Casa ou comissão. (...)” (STF, ADI 3.046-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 15-04-2004, v.u., DJ 28-05-2004, p. 492, RTJ 191/510). (g.n)
Portanto, referido projeto não se coaduna com dispositivos da Constituição da República, reproduzido na Carta Maior do Estado do Espírito Santo, bem como expressa disposição da Lei Orgânica em sentido contrário.
No caso do município de Linhares, a Lei Orgânica é clara ao dispor que “compete exclusivamente”, à Câmara Municipal a atribuição de “exercer, com auxílio do Tribunal de Contas, a fiscalização financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município”. Ou seja, o texto coloca o papel fiscalizatório como função do colegiado do Poder Legislativo e não do vereador, de forma individual, como bem pretende o nobre edil com o projeto em comento. Vejamos o que preceitua o artigo 16, IX, da lei orgânica:
Art. 16 É de competência exclusiva da Câmara Municipal, dentre outras, as seguintes:
(...)
IX - exercer, com auxílio do Tribunal de Contas, a fiscalização financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município;
Ou seja, o presente projeto de lei fere o princípio da harmonia e separação entre os Poderes, ao criar mecanismos de fiscalização direta pelos vereadores, sem fundamento de validade nas Constituições Federal e Estadual e a própria Lei Orgânica.
O Poder Legislativo Municipal – e, assim, suas respectivas Comissões, é que se conferiu o poder de fiscalização da administração direta ou indireta do Poder Executivo Municipal. Vale dizer, que esse poder é outorgado, em qualquer hipótese, aos órgãos colegiados, totais ou parciais, da Câmara Municipal de Linhares, nunca aos seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação ou presentação de sua Casa ou Comissão.
A fim de corroborar com tal afirmação a Constituição Federal de 1988 diz que na organização municipal não existe previsão de acesso imediato, em órgão ou repartição pública, a todo e qualquer documento, registro, processo administrativo, expediente e arquivo, tampouco autorização para examinar, vistoriar ou copiar.
Ao vereador, a Constituição Federal indica instrumentos fiscalizatórios que asseguram o equilíbrio e a independência entre os poderes, como podemos extrair do artigo 31 da nossa carta cidadã. Vejamos:
“Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei”.
Ao extrapolar sua competência legiferante, a Câmara Municipal afronta o princípio da separação entre os Poderes, sedimentado no art. 17 da Constituição do Estado do Espírito Santo.
Portanto, no exercício de sua competência e autonomia política cabe ao Legislativo Municipal apenas e tão somente legislar sobre matérias de sua competência, bem como a atribuição típica e predominante da Câmara é a normativa, isto é, a de regular a administração do Município e a conduta dos munícipes no que afeta aos interesses locais.
Essas são as considerações sobre os aspectos jurídicos do presente projeto de lei.
No que tange a técnica legislativa e de redação, verificamos que o projeto ora analisado apresenta os parâmetros exigidos pela LEI COMPLEMENTAR Nº 95, DE 26 DE FEVEREIRO DE 1998.
Tendo em vista o que preconiza o parágrafo único do art. 69 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Linhares, o presente Projeto de Lei deverá tramitar preliminarmente pela Comissão de Constituição e Justiça, bem como ter seu mérito analisado pela Comissão de Educação, Cultura, Turismo, Esporte, Saúde, Assistência Social, Segurança, Obras e Meio Ambiente uma vez que a matéria do presente projeto encontra-se dentro de suas competências previstas regimentalmente.
As deliberações do Plenário serão tomadas por MAIORIA SIMPLES, e o processo de votação será SIMBÓLICA, conforme estabelecem os artigos 136, § 1°, inciso I C/C o artigo 153, inciso I, todos do Regimento Interno da Câmara.
Assim a PROCURADORIA da Câmara Municipal de Linhares, após análise e apreciação do Projeto em destaque, é de PARECER CONTRÁRIO À APROVAÇÃO DO PRESENTE PROJETO DE LEI, por ser INCONSTITUCIONAL.
É o parecer, salvo melhor Juízo de Vossas Excelências.
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Documento(s) da tramitação:
Despacho Digital
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